Quando me inscrevi no vestibular da UFF, em 1994, para o curso de letras português – italiano, muitas pessoas me perguntaram por que eu tinha escolhido justamente o italiano, visto que não era nem mesmo descendente e, além do mais, não seria uma língua que me daria “um futuro” profissional promissor como me daria, por exemplo, o inglês. O único contato que tinha tido com a língua italiana foi no período em que estudei no Istituto Italiano di Cultura, muitos anos antes de prestar vestibular. Lembro que, naquela época, uma amiga de trabalho me falou de um cantor italiano chamado Eros Ramazzotti, que tinha acabado de lançar um CD cujo nome era Più bella cosa, que não sei como não furou de tanto que ouvi!
(Coliseu – créditos da imagem: Wikipedia)
Na verdade, semanas antes, eu tinha prestado vestibular para a UERJ e UFRJ (português – inglês), sem ter conseguido passar para nenhuma das duas. Quando chegou o dia do vestibular da UFF, eu estava convencida de que não passaria, me sentia até um pouco triste e desmotivada. Para minha surpresa, não só passei, como passei em 4° lugar! Todo o meu sacrifício, todas as minhas noites sem dormir e o meu cansaço crônico tinham sido premiados: eu era, oficialmente, aluna de letras da UFF e a minha viagem através do universo da italianística estava apenas começando.
(Lago di Garda – créditos da imagem: Wikipedia)
Todavia, a pergunta “por que estudar italiano?” pode gerar muitas respostas, pois a maioria dos alunos o faz por motivos vários, que, nem sempre, têm a ver com a escolha profissional, como é o caso do inglês, por exemplo. Muitas pessoas se inscrevem em um curso de italiano por serem descendentes, para as quais a língua italiana é um patrimônio de família que deve ser preservado e transmitido de pai para filho e assim por diante. Tive alunos descendentes que, quando contavam a história do bisavô ou da bisavó, ficavam com os olhos marejados de lágrimas, pois eram histórias de sacrifícios e privações que quase todos os imigrantes vivenciaram, quando saíram da Itália “per fare l’America“, ou seja, tentar uma vida melhor em terras americanas. Outros estudam italiano simplesmente porque o acham uma língua bonita, sonora, doce, romântica; todos adjetivos que ouvimos pelo menos um vez na vida relacionados à língua italiana.
Vale ressaltar que o ápice da imigração italiana no Brasil deu-se entre os anos de 1880 e 1930. A maior parte dos ítalo-brasileiros (descendentes de imigrantes italianos) concentra-se, sobretudo, nos estados do Sul e do Sudeste do Brasil. De acordo com dados estatísticos fornecidos pela Embaixada Italiana, em 2013, cerca de 30 milhões de descendentes de italianos viviam no Brasil, isto é: 15% da população brasileira (metade do Estado de São Paulo).
(Créditos da imagem: archeoclubtorre)
Não precisamos de estatísticas para intuir o quanto da cultura italiana está inserida na cultura brasileira, o quanto somos, em algum modo, todos descendentes de italianos. Acredito que a descendência mais significativa é a que chegou até nós por meio do latim: afinal, Roma foi o berço do Império Romano. Em que medida, até hoje, não somos também um pouco romanos? Italiano, português, francês, espanhol, romeno são todas línguas neolatinas, filhas do latim vulgar falado pelas ruas de Roma e de todos os territórios conquistados pelas legiões romanas.
(Créditos da imagem: Pulcinella)
Já pararam para pensar quantos vocábulos os imigrantes italianos deixaram de herança à língua portuguesa? Quantos deles usamos todos os dias sem nos darmos conta? Darei apenas alguns exemplos: adágio, andante, camarim, caricatura, aquarela, madrigal, serenata, sonata, soneto, soprano, violino, violoncelo, arlequim, artesão, pastel, cantina, capricho, carnaval, mortadela, gazeta, palhaço, polenta, poltrona, trampolim, macarrão, salame, salsicha, etc. Todos vocábulos, como podemos perceber, de grande cultura ligados às diversas áreas do saber.
(Imigração Italiana – créditos da imagem: Wikipedia)
Quem nunca ouviu dizer que o italiano é a língua das artes, da poesia, da moda, da culinária, da música? De fato, a musicalidade da língua italiana é considerada “la più bella del mondo“, pois até mesmo os verbos terminam por vogal. Quantos de nós não sabemos pelo menos uma canção italiana de memória graças, sobretudo, à série de novelas que abordaram, exatamente, imigração italiana no Brasil? Na verdade, o italiano é considerado língua franca no campo da musica clássica, que, há séculos, reúne músicos e compositores provenientes de todo o mundo. Termos inerentes ao universo musical, como, por exemplo, andante con moto, larghetto, crescendo, pizzicato, adagissimo, maestoso, adagio un poco mosso, allegro, e assim por diante, nunca tiveram um tradução adequada e unívoca, razão pela qual são usadas, muitas vezes, em língua original.
Por fim, poderia colocar aqui tantas outras motivações que levam os estudantes que, como eu, não são descendentes e escolherem a italianística como objeto de estudo para toda a vida, mas acredito que cada um tem a sua motivação pessoal, seja qual for. Então, a resposta à pergunta “por que estudar italiano?” já foi respondida nas entrelinhas deste texto.
Arrivederci e buona lettura!